sábado, 16 de julho de 2011

Formação Familiar


Homem e mulher, diferentes na sua identidade e singularidade, devem construir a harmonia conjugal e esta é uma conquista que surge a partir da diversidade. Chamado à unidade em meio às diferenças individuais, o casal necessita empenhar-se nesta busca que supõe, muitas vezes, a renúncia de si em vista do bem comum do casal e da família. Não retira a individualidade dos dois, mas enriquece-os mutuamente, complementando-os.

A nossa inclinação natural é querer que domine o nosso modo de pensar e o que queremos. Isso é fruto do egoísmo e do egocentrismo, inclinações da nossa humanidade fragilizada pelo pecado original. É o Espírito que, a partir da adesão da vontade humana, constrói a unidade entre o casal, gerando frutos de amor, respeito pelas diferenças, liberdade e espontaneidade, segurança e paz. A seguir, algumas estratégias que podem favorecer a busca da harmonia conjugal.

Os dez mandamentos do casal

Uma equipe de psicólogos e especialistas americanos, que trabalhava em terapia conjugal, elaborou os Dez Mandamentos do Casal. Felipe Aquino faz uma reflexão sobre eles:

1. Nunca irritar-se ao mesmo tempo: A todo custo evitar a explosão. Quanto mais a situação é complicada, mais a calma é necessária. Então, será preciso que um dos dois acione o mecanismo que assegure a calma de ambos diante da situação conflitante. É preciso nos convencer de que, na explosão, nada será feito de bom. Dom Helder Câmara tem um belo pensamento que diz: “Há criaturas que são como a cana, mesmo postas na moenda, esmagadas de todo, reduzidas a bagaço, só sabem dar doçura...” Seria muito eficaz usar a doçura para enfrentar os desafios da vida a dois.

2. Nunca gritar um com o outro: A não ser que a casa esteja pegando fogo. Quem tem bons argumentos não precisa gritar. Gritar, muitas vezes, é próprio daquele que na sua insegurança, precisa impor pelos gritos aquilo que não consegue pelos argumentos e pela razão.

3. Se alguém deve ganhar na discussão, deixar que seja o outro: Perder uma discussão pode ser um ato de inteligência e de amor. Dialogar jamais será discutir, pela simples razão de que a discussão pressupõe um vencedor e um derrotado, e no diálogo não. Portanto, se por descuido nosso, o diálogo se transformar em discussão, permita que o outro “vença” para que mais rapidamente ele termine. Discussão no casamento é sinônimo de “guerra”; uma luta inglória. Que vantagem há em se ganhar uma disputa contra aquele que é a nossa própria carne? É preciso que o casal tenha a determinação de não provocar brigas; não podemos nos esquecer que basta uma pequena nuvem para esconder o sol. Às vezes, uma pequena discussão esconde, por muitos dias, o sol da alegria no lar.

4. Se for inevitável chamar a atenção, fazê-lo com amor: A outra parte tem que entender que a crítica tem o objetivo de somar e não de dividir. Só tem sentido a crítica que for construtiva; e essa é amorosa, sem acusações e condenações. Antes de apontarmos um defeito, é sempre aconselhável apresentar duas qualidades do outro. Isso funciona como um anestésico para que se possa fazer o curativo sem dor. E reze pelo outro antes de abordá-lo em um problema difícil. Peça ao Senhor e a Nossa Senhora que preparem o coração dele para receber bem o que você precisa dizer-lhe. Deus é o primeiro interessado na harmonia do casal.

5. Nunca jogar no rosto do outro os erros do passado: A pessoa é sempre maior que seus erros, e ninguém gosta de ser caracterizado por seus defeitos. Toda vez que acusamos a pessoa por seus erros passados, estamos trazendo-os de volta e dificultando que ela se livre deles. Certamente não é isso que queremos para a pessoa amada

Papa Paulo VI, diante da guerra fria e da ameaça de guerra nuclear, avisou o mundo: “A paz impõe-se somente com a paz, pela clemência, pela misericórdia, pela caridade”. Ora, se isto é válido para o mundo encontrar a paz, muito mais é válido para todos os casais viverem bem. Portanto, como ensina Thomás de Kemphis, na Imitação de Cristo, “Primeiro conserva-te em paz, depois poderás pacificar os outros”.

6. A displicência com qualquer pessoa é tolerável, menos com o cônjuge: Na vida a dois, tudo pode e deve ser importante, pois a felicidade nasce das pequenas coisas. A falta de atenção para com o cônjuge é triste na vida do casal e demonstra desprezo para com o outro. Seja atento ao que ele diz, aos seus problemas e aspirações.

7. Nunca ir dormir sem ter chegado a um acordo: Se isso não acontecer, no dia seguinte, o problema poderá ser bem maior. Não se pode deixar acumular problema sobre problema sem solução. Os problemas da vida conjugal são normais e exigem de nós atenção e coragem para enfrentá-los, até que sejam solucionados, com o nosso trabalho e com a graça de Deus. A atitude da avestruz, da fuga, é a pior que existe. Com paz e perseverança busquemos a solução.

8. Pelo menos, uma vez ao dia, dizer ao outro uma palavra carinhosa: Muitos têm reservas enormes de ternura, mas esquecem de expressá-las em voz alta. Não basta amar o outro, é preciso demonstrar esse sentimento também com palavras e especialmente com gestos. Para as mulheres, isso tem um efeito quase mágico. É um tônico que muda completamente o seu estado de ânimo, humor e bem-estar. Muitos homens têm dificuldade neste ponto; alguns por problemas de educação, mas a maioria porque ainda não se deu conta da sua importância.

9. Cometendo um erro, saber admiti-lo e pedir desculpas: Admitir um erro não é humilhação. A pessoa que admite o seu erro é madura e demonstra ser honesta consigo mesma e com o outro. Quando erramos, não temos duas alternativas honestas, apenas uma: reconhecer o erro, pedir perdão e procurar remediar o que fizemos de errado, com o propósito de não repeti-lo. Isso é ser humilde. Agindo assim, mesmo os nossos erros e quedas serão alavancas para o nosso amadurecimento e crescimento. Quando temos a coragem de pedir perdão, vencendo o nosso orgulho, eliminamos quase de vez o motivo do conflito no relacionamento, e a paz retorna aos corações. É nobre pedir perdão!

10. Quando um não quer, dois não brigam: É a sabedoria popular que ensina isso. Será preciso então que alguém tome a iniciativa de quebrar o ciclo pernicioso que leva à briga. Tomar essa iniciativa será sempre um gesto de grandeza, maturidade e amor. E a melhor maneira será “não pôr lenha na fogueira”, isto é, não alimentar a discussão. Muitas vezes, é pelo silêncio de um que a calma retorna ao coração do outro. Outras vezes, será por um abraço carinhoso, ou por uma palavra amiga.

Todos nós temos a necessidade de um “bode expiatório” quando algo adverso nos ocorre. Quase que inconscientemente queremos, como se diz, “pegar alguém para Cristo”, a fim de desabafar as nossas mágoas e tensões. Isso é um mecanismo de compensação psicológica que age em todos nós nas horas amargas, mas é um grande perigo na vida familiar. Quantas e quantas vezes acabam “pagando o pato” pessoas que nada têm a ver com o problema que nos afetou. Às vezes, são os filhos que apanham do pai que chega em casa nervoso e cansado; outras vezes, é a esposa ou o marido que recebe do outro uma enxurrada de lamentações, reclamações e ofensas, sem quase nada ter a ver com o problema em si.

É necessário vigilância nestas horas para não permitir que o “sangue quente nas veias”gere uma série de injustiças com os outros. No serviço, e fora de casa, respeitamos as pessoas, o chefe, a secretária etc.; mas, em casa, onde somos “familiares”, o desrespeito acaba acontecendo. Exatamente onde estão os nossos entes mais queridos, no lar, é ali que, injustamente, descarregamos o stress do dia e as preocupações. Os filhos, a esposa, o esposo, são aqueles que merecem o nosso primeiro amor e tudo de bom que trazemos no coração. Portanto, antes de entrarmos no recinto sagrado do lar, é preciso deixar, lá fora, as mágoas, os problemas e as tensões. Estas, até podem ser tratadas com o cônjuge, buscando-se uma solução para os problemas, mas, com delicadeza, diálogo, fé e otimismo.

O amor é o oxigênio da vida em família

É o amor dos esposos que gera o amor da família e que produz o “alimento” e o “oxigênio” mais importante para os filhos. Na Encíclica Redemptor Hominis, o Papa João Paulo II disse algo marcante: “O homem não pode viver sem amor. Ele permanece para si próprio um ser incompreensível e a sua vida é destituída de sentido, se não lhe for revelado o amor, se ele não se encontra com o amor, se não o experimenta e se não o torna algo próprio, se nele não participa vivamente” (RH, 10). Sem o amor a família nunca poderá atingir a sua identidade, isto é, ser uma comunidade de pessoas. O amor é mais forte do que a morte e é capaz de superar todos os obstáculos para construir o outro. Assim se expressa o Cântico dos Cânticos: “...o amor é forte como a morte... Suas centelhas são centelhas de fogo, uma chama divina. As torrentes não poderiam extinguir o amor, nem os rios o poderiam submergir.” (Ct 8,6-7)

Há alguns casais que dizem que vão se separar porque acabou o amor entre eles. Será verdade? Seria mais coerente dizer que o “verdadeiro” amor não cresceu e não amadureceu; foi queimado pelo sol forte do egoísmo e sufocado pelo amor próprio de cada um. Não seria mais coerente dizer: “Nós matamos o nosso amor?”. O poeta cristão Paul Claudel resumiu de maneira bela a grandeza da vida do casal:

“O amor verdadeiro é dom recíproco que dois seres felizes fazem livremente de si próprios, de tudo o que são e têm. Isto pareceu a Deus algo de tão grande que Ele o tornou sacramento”.


Bibliografia:
AQUINO, Felipe. Família, Santuário da vida. Canção Nova, 2006
Teologia do Matrimônio. Santuário, 2009.
BENTO XVI, Papa. Carta Encíclica: Deus Caritas Est. Paulus, 2009.
PAULO II, Papa João. Encíclica: Sexualidade, Verdade e Significado. Paulinas, 1998.
Catecismo da Igreja Católica. Paulinas, 1998.



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